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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Carta a meu pai: o porquê das minhas escolhas.

"Pai,

Desculpa o email tão longo! Mas fico feliz de ter finalmente terminado de escrevê-lo. Desde que conversamos no telefone sobre parto eu queria te mostrar um pouco mais sobre os porquês das minhas escolhas ou buscas, que podem parecer loucura, mas têm um significado muito importante pra mim. Não quero "convencer" você, mas quero que você participe dessa vivência, trazer você pra perto dessa história, mesmo não estando lá na hora e também que se sinta tão confiante quanto eu, a cada passo que dou. Às vezes pode parecer que eu quero ser diferente ou chocar, mas a verdade é que eu SOU uma pessoa diferente e o que eu quero não é chocar, eu só sou verdadeira comigo mesma e sigo meu coração. Eu sei que você não vai ler nem ver tudo isso agora nem de uma vez, mas queria pedir que você fosse lendo e vendo aos poucos e tentando compreender o porquê das minhas escolhas que segundo estudos, não é menos segura do que um parto normal hospitalar, é muito mais segura do que uma cesárea eletiva (sem indicação) e ainda aumenta as chances de uma experiência mais satisfatória e digna para a família, leia-se: oposto de traumático.

Com a inteligência que meus pais me deram, eu não posso fechar os olhos para algumas questões que engolimos confiando em nosso sistema de saúde, como se não fosse óbvio o absurdo. Nem minha cabeça, nem meu coração me perdoariam por permitir que eu, meu filho(a) e mesmo minha família passássemos por algumas vivências totalmente desnecessárias sabendo que (elas SIM) pudessem botar em risco um de nós. Riscos físicos com certeza, mas também psicológicos, que não são levados em conta, pois tem-se como normal uma série de coisas que NÃO SÃO. E se você se permitir olhar com meus olhos, você vai achar o mesmo. Um dia eu pensei igual a todo mundo em relação ao parto, quando não se conhece outra coisa, a gente continua achando que o que conhecemos é bom. Ainda mais numa sociedade cada vez mais globalizada e adepta da tecnologia. Só que alguma coisa me levou a conhecer um outro lado, que eu queria que você conhecesse pra entender.

Uma introdução:

Chen (2006) levanta dados curiosos sobre os partos no Brasil:

1) 79% dos partos realizados no setor privado são cesarianas. (Dados de 2004)
2) 27% dos partos realizados pelo SUS são cesarianas. (Dados de 2004)
3) A OMS recomenda que apenas 15% dos partos sejam cesáreos.
4) 77% das mulheres brasileiras entrevistadas preferem parto normal, segundo dados de entrevistas realizadas antes e depois do parto.
5) Um parto normal pode durar até 48 horas.
6) O custo do parto normal para médicos e hospitais é até 30% maior do que na cesariana, contabilizando o tempo de atenção dispensados pelas enfermeiras e equipe médica, o tempo de utilização de salas especiais para parto, etc..
7) O número de cesarianas no SUS foi reduzido no momento em que o Governo decidiu estabelecer uma cota mensal de remuneração para cesarianas. Isto é, acima de uma determinada porcentagem, a cesariana não é remunerada.
8) O número de cesarianas não diminuiu no setor privado, apesar da equiparação de remuneração dos médicos pelos dois tipos de procedimentos.
9) O Ministério da Saúde não tem o poder de interferir na saúde privada.
10) O órgão regulador que fiscaliza os planos de saúde e convênios é a ANS, que pouco pode fazer enquanto não houver denúncias.
11) Apesar da cesariana ter se tornado uma cirurgia mais segura, continua sendo uma cirurgia de amplo aspecto, com todos os riscos de uma cirurgia de amplo aspecto.
12) Os riscos de complicações posteriores a uma cesariana são 350% maiores para a mãe e, para o bebê, são 400% maiores no que se referem a problemas respiratórios.
13) Hospitais lucram na venda dos medicamentos e nas internações, especialmente internações em UTIs.
14) Hospitais e profissionais da área da saúde também têm metas de "produtividade". Internações e procedimentos desnecessários são utilizados para bater essas metas.
15) Médicos conseguem negociações mais vantajosas com os hospitais, pela quantidade de clientes internados e pela quantidade de horas utilizadas de centro cirúrgico.
16) Os hospitais cobram esta conta dos convênios. Os convênios cobram este custo desnecessário de todos os segurados.
17) O maior cliente do hospital não é o paciente, mas o médico.
18) Cesárea por conveniência médica é uma trangressão ética.
19) Em 60% dos casos de cesárea no Brasil, a razão médica apresentada não justificava o procedimento e era no mínimo duvidosa.

Abaixo, botei alguns links de vídeos. Alguns vídeos são BEM fortes. Alguns já me fizeram chorar, uns de horror, outros de alegria. Desculpe se forem impróprios, mas eu não sei de outra forma pra mostrar meu ponto de vista se não sendo realista.

Esse é o cuidado padrão com o recém nascido na maternidade quando ele nasce. Você deve ter acompanhado isso e sabe que é assim mesmo. Você, como a enorme maioria de nós, sabe que isso acontece e acha super normal. Eu não. Eu acho cruel. Penso que o bebê precisa ficar com a mãe assim que nasce, é o período de vínculo entre mãe e bebê, mas não só por isso. O bebê vem de um ambiente quentinho tranquilo lá no ventre da mãe e de repente o puxam desajeitadamente pra um lugar gelado, cheio de gente "sem rosto", com vozes estranhas, luzes fortes, muito barulho, quando ele precisa de colo, e a mãe precisa dele no peito, pois esse contato faz ela produzir ocitocina, que ajuda que ela expulse a placenta sozinha e tenha menos risco de infecção por danos na placenta advindos de tração pra retirada da mesma. O bebê precisa do calor do colo e da voz da mãe - e do pai - que ele já conhece, precisa ser acalmado, precisa conhecer o ambiente, o rosto por trás das vozes que conhece, o cheiro de sua mãe. Ao invés disso ele é arrancado de perto dos pais, pelado, pendurado pelos pés que nem um frango abatido, é analisado, furado, aspirado, medido, pesado sem nenhum pudor ou cuidado, uma coisa tão frágil e provavelmente assustada... A mãe fica lá, vazia, imobilizada. E o pai, ninguém nem pensa no pai uma hora dessa, que deveria participar ativamente. Então ele fica lá, assistindo a tudo meio perdido e assustado. O cuidado humanizado não é assim, não. O bebê não sai do colo da mãe pra ser examinado, o pai não precisa se sentir dividido entre amparar sua mulher ou acompanhar seu filho nos procedimentos e as coisas são feitas com calma e carinho, SE necessárias, na presença dos pais. Pra que você saiba (porque eu também não sabia), a injeção que eles dão no bebê (de vitamina K, pra evitar que ele tenha icterícia que é normal nos primeiros dias do bebê) pode ser dada por via oral em várias doses, depois do vínculo com a mãe estabelecido, depois do trauma do parto digerido e o nitrato de prata que aplicam nos olhinhos dele arde muito e serve como antibiótico caso a mãe tenha gonorréia (que eu não tenho). Eu não quero isso pro meu filho: El Nacimiento de Marcelo. O que mas me emociona é como o bebê fica tranquilo quando finalmente o levam pra perto da mãe. Se você acha que o bebê "esquece" por ser pequeno demais... eu tenho minhas dúvidas.

Algumas rotinas podem atrapalhar se não forem necessárias, algumas nem sempre fazem bem. Tracionar um bebê ou usar fórceps ou vácuo em um bebê que tem dificuldade de sair e começa a entrar em sofrimento, pode ser bom, mas fazer o mesmo a um bebê que vai sair sozinho, saudável e em seu tempo, pode causar sérios danos: Newborn Birth Injuries: The Untold Story.

A mulher, se deixada tranquila e segura ao invés de receber um monte de ameaças caso não se submeta a intervenções de rotina, a seu tempo consegue expulsar o bebê sozinha, naturalmente, restando à tecnologia monitorar o processo intermitentemente e se colocar num papel REALMENTE salvador CASO haja algum problema. Fazer a criança nascer mais rápido, não significa nascer melhor. Mesmo os médicos humanizados se dizem reféns dos hospitais onde trabalham quando se trata de intervenções de rotina, o que pode atrapalhar o processo do trabalho de parto em um nível emocional/psicológico. Mesmo eles encorajam a mãe à esperar até o último momento pra dar entrada em uma maternidade para que a ele caiba agir de pronto. As rotinas são pra quem tem indicação, ao invés, são feitas rotineiramente em todas as mães e bebês, sem distinção e por isso têm maior probabilidade de causar danos. Nem toda mulher precisa ter seu períneo cortado (na verdade quase nenhuma e quando precisa, na maioria das vezes, é por nervosismo e impaciência da mesma de expulsar o bebê), nem toda mulher precisa de ocitocina por não ter dilatação, o que aumenta consideravelmente a intensidade das contrações e a dor, ela pode só precisar de tempo e incentivo. Nem toda mulher precisa de uma cirurgia de médio porte pra retirar o bebê, isso é a maior causa dos números ainda altos de mortalidade materna no Brasil. Isso sem falar de procedimentos realizados nos hospitais que são degradantes e que estudos já afirmaram não ter embasamento técnico nenhum que beneficie o parto como a raspagem de pêlos para o parto normal (que pinica depois), a lavagem intestinal e enema, a manobra de Kristeller onde o médico empurra a barriga da mulher pra o bebê sair... E ainda tem a litotomia, a famosa posição em que os médicos nos colocam deitadas e com as pernas amarradas, contra a força da gravidade e em baixo do peso desconfortável da barriga, o que piora qualquer contração, para que ele possa "retirar o bebê" com mais conforto. Não é à toa que todo mundo tem terror do parto, homens e mulheres. No hospital têm-se como padrão instituído que a mulher não consegue expulsar o bebê sem uma série de "ajudas", o que vai de encontro às orientações da Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde. E é essa violência aqui, eu não quero sofrer à toa e nem você deveria querer isso para sua filha, nem meu marido querer pra esposa dele: Callate y Puja.

Isso é um pouco mais parecido com o parto que eu desejo: Dia do Nascimento. Essa mulher se chama Naoli, ela é uma parteira mexicana. Eu nunca falei pro Derick nada disso que eu estou lhe escrevendo. Até porque, eu não precisei. Ele era contra, também desconhecia muita coisa, achava que uma ce´sarea era mais segura, mas confiou em mim e me acompanhou às reuniões. Leu. E acho que esse foi o vídeo que o fez concordar comigo que esse era o caminho.

Agora, eis algumas razões pelas quais eu estou buscando um caminho mais humano pra mim, pra minha família e pro meu filho. Pra começar, hoje eu recebi esse vídeo de uma estudiosa que eu já li uma tese de mestrado chamada "ciência do início da vida" e é isso que ela fala que eu estou buscando! Não é só pra ser diferente que estou escolhendo um caminho x, é uma coisa que fala muito profundo dentro de mim, uma busca por uma experiência que transcende o que se prega numa sociedade mecanizada e estéril por natureza. Espero que entenda: Maternidade Consciente por Eleanor Luzes

Esse aqui é o parto mais lindo que eu já vi: Naitre Enchanteé.

Certa vez te mandei uma Revista Online Sobre Parto. Ela falava sobre todos os tipos de parto e tirava algumas dúvidas sobre mitos e fatos. Acho legal as inforções dela, não sei se você chegou a ver.

Bem, espero que minhas escolhas pareçam menos loucas agora. Queria dizer que eu estou buscando não um parto natural a qualquer custo, mas uma equipe que seja capaz de me acompanhar com respeito e carinho, em quem eu confio para me dar forças e incentivos para vencer pensamentos e medos incutidos em mim por uma cultura insalubre de parto e realizar o que eu desejo, até onde puder ir. E também em quem eu vou confiar se em algum momento me disser que preciso de alguma intervenção ou transferência, pois sei que as razões serão verdadeiras, ao invés de pensar se o que me falam é uma desculpa para me inserir em um protocolo no qual não me encaixo por conveniência médica ou interesse financeiro, ou mesmo desconhecimento de novos estudos. E para isso, essa equipe precisa acreditar nas mesmas coisas que eu, ser a favor da vida e respeitar a fisiologia do nascimento, ser ativista mesmo. Eu quero me sentir tranquila, segura e bem cuidada, e acho que isso não é loucura.

Tem um médico obstetra francês que diz que "pra mudarmos o mundo, é preciso antes mudar a forma de nascer". E eu concordo. Se toda mulher e homem desejasse trazer um bebê ao mundo assim, o que não fariam na criação de seus filhos?

Te amo, e o seu apoio é muito importante pra mim.

Paulinha"




"AMADA filha,

Suas escolhas sempre me preocuparam, acho que a vida toda, mas nunca as achei malucas ou sem sentido. Te acho corajosa e determinada isso sim.  Se você puxar pela memória vai se lembrar que quando vocês eram pequenos, disse várias vezes para vocês “mesmo que vocês estiverem errados ou fizerem uma escolha que eu não concorde (ou conheça, como neste caso) eu vou estar sempre do lado de vocês”.
Fico imensamente grato pelas informações que você me passa, não pela informação em si, mas pelo cuidado em me orientar.
Te amo filha e escrevo isso MUITO emocionado.  Não poderia esperar nada mais gratificante do que a importância deste ato.
Gostaria muito, não só de fazer parte desta sua jornada, mas de estar do seu lado ou muito perto no Dia do Nascimento (Será que posso ?).  Sei que irei estar com o coração na mão, mas é que ele já estará prontinho para ser entregue a sua nova família.
Amo de verdade vocês 3.

P S : Vi o vídeo da ultra e ainda acho a cara do avô."

3 comentários:

  1. Se você não conseguir ler esse comentário por aqui (já q estou postando atrasado em relação à atualização do blog), comentarei pessoalmente. Tô achando um maior barato e muito lindo todo esse seu movimento em procurar algo mais natural e divulgar isso por aqui. Muitas coisas eu nunca soube pq, realmente, gravidez/parto eram coisas que eu não estava programando pra minha vida. continua...

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  2. Minha mãe gostaria de ter tido parto normal de nós dois mas infelizmente não foi possível, erroneamente ou não. O meu parto precisou ser cesariana, diz ela, pq eu estava atravessado e não conseguia encaixar de forma alguma. No caso do meu irmão, ela estava obstinada a ligar as trompas e por isso precisou da cesária. Coitada dela no segundo parto pq a anestesia não pegou e ela acabou apagando.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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